quinta-feira, 30 de junho de 2011

Wilza Carla e a pornochanchada

Publicado no site da revista Alfa em junho de 2011
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Wilza Carla, a esquecida atriz e jurada do programa Sílvio Santos, morreu na terça-feira dia 21 e achei muito interessante que uma das manchetes na internet sobre o assunto era “faleceu a musa obesa da pornochanchada”. Quem tem bem mais de 40 anos, teve a oportunidade de curtir esse gênero de filme que acabou marcando profundamente a impressão do brasileiro sobre o cinema nacional. A pornochanchada foi um filão para muitos produtores, um berço de diretores e atores e também uma maldição para quem queria um cinema brasileiro mais sério e trabalhado.


E veio bem a calhar nos anos da ditadura. Explicando melhor, tudo no Brasil tinha “reserva de mercado”, uma estratégia tacanha de fazer com que os produtos estrangeiros perdessem a competitividade frente aos nossos, ou seja, tínhamos que consumir coisas ruins porque éramos obrigados. No caso do cinema, as salas tinham a obrigatoriedade de passar uma quantidade mínima de filmes nacionais por ano. O problema era que estúdios mais sérios como o Vera Cruz haviam fechado e a saída foi buscar talentos no cinema marginal.

Aliado a isso, apesar da censura forte, o brasileiro descobriu que peito, bunda e sexo simulado atraía multidões ao cinemas e essa combinação se tornou a fórmula de sucesso para produções toscas, baratas e, mesmo assim, com boa bilheteria. Aos poucos nomes como Carlos Reichenbach, Claudio Cunha, David Cardoso, Ody Cunha, Fauzi Mansur e atores e atrizes como Helena Ramos, Matilde Mastrangi, Nicole Puzzi,  Paulo César Pereio, Sonia Braga, Nádia Lippi, Antonio Fagundes, Vera Fischer, entre outros caíram na preferência do povo.

E como a criatividade do brasileiro é algo sem concorrência no mundo, apesar da falta de sexo explícito, os títulos dos filmes tinham que puxar para uma coisa mais sexual e dá-lhe pérolas como Alucinada Pelo Desejo, Amadas e Violentadas, Roberta, a Moderna Gueixa do Sexo, Tem Piranha no Garimpo, A Ilha dos Prazeres Proibidos, A Tara das Cocotas na Ilha do Pecado, Eu Faço – Elas Sentem, A Noite das Taras e assim por diante. Os cartazes também eram sensacionais, especialmente aqueles pintados pelo genial Benício, de uma fidelidade incrível em cima do retratado.

Só que nem tudo era assim tão ruim. Algumas comédias como Histórias que Nossas Babás Não Contavam, uma genial versão de Branca de Neve, onde a princesa era a deslumbrante mulata Adele Fátima e que tinha Costinha como o caçador ou ainda O Bem Dotado – O Homem de Itú, onde Nuno Leal Maia tem problemas sérios devido ao tamanho de seu pênis ou até mesmo A Super Fêmea com Vera Fischer, se salvam nesse rol enorme de roteiros horrorosos. Também haviam as boas adaptações de Jorge Amado ou Nelson Rodrigues com Dona Flor e Seus Dois Maridos, A Dama do Lotação, Os Sete Gatinhos, entre outras. O difícil mesmo era aguentar os filmes pseudo-cabeça dessa época como Mulher Objeto ou Ariella, a Paranóica, arrastados, chatos e com interpretações de doer.
 
Em 1980, o ator Oásis Minitti protagonizou a chamada “primeira cena de sexo explícito em filme nacional” em Boneca Cobiçada, que tinha ainda Aldine Müller e Francisco di Franco no elenco. No ano seguinte veio Coisas Eróticas, o primeiro longa de sexo explícito, com três péssimas historinhas assinadas pelo produtor e roteirista Rafaelle Rossi e por Laente Calicchio e que conseguiu levar quase cinco milhões de pessoas às salas escuras, sendo a 12a maior bilheteria da história do cinema nacional. Depois disso, o público queria mesmo eram atores e atrizes fazendo sexo de verdade e aí a pornochanchada em si acabou morrendo aos poucos, mesmo que no começo, obras como Oh, Rebuceteio! de Claudio Cunha conseguissem unir um pouco das duas coisas (esse filme aliás tinha uma atriz bem mignonzinho e com cara de namoradinha que encantou todo mundo na época e desapareceu sem deixar rastro, Eleni Bandettini). E não podemos esquecer de Senta no Meu que Eu Entro na Sua de 1985, um clássico do mau gosto, com péssimas cenas de sexo, diálogos e dublagens de fazer gritar de rir, mas com a inventiva historinha do homem que tem um pênis no alto da cabeça (sim, com cenas explícitas dele usando a ferramenta).

A pornochanchada acabou fazendo com que as pessoas, por décadas, relacionassem cinema brasileiro com nudez e palavrão. Fez a minha alegria de juventude graças aos extinto programa “Sala Especial” da antiga TV Record, que fazia com que as noites de sexta-feira fossem mais engraçadas. E é interessante notar que as atuais produções nacionais , repletas de atores e atrizes globais, parecem até ter medo de mostrar alguém nu, excetuando, obviamente, Bruna Surfistinha porque aí já ia ser demais. Morreu Wilza Carla, morreu a pornochanchada e estamos mais certinhos e recatados. Se isso é bom ou ruim, só você vai me dizer.

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