sábado, 14 de fevereiro de 2009

Conheça o melhor do humor cáustico

Publicado no Terra em janeiro de 2009
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O dia 29 de janeiro deveria ser proclamado Dia Mundial do Sarcasmo. Isso porque 1895 nascia no Rio Grande do Sul Apparício Torelly, o Barão de Itararé, grande pioneiro do humor político-social no Brasil. E no mesmo dia, mas há 53 anos, falecia o jornalista e satirista H.L Mencken, um dos críticos mais mordazes da sociedade americana.

H.L. Mencken
Comecemos pelo sensacional escritor gringo. Filho de um fabricante de charutos, Menckel começou a vida profissional como repórter no Baltimore Morning Herald, mudando-se logo depois para o The Baltimore Sun. Rapidamente passou a escrever os editoriais que o fizeram famoso. Influenciado pela ironia de Mark Twain e Ambrose Pierce, além de ser fã de Joseph Conrad e Frederick Nietsche, Mencken não poupava ninguém em seus artigos, sendo conhecido como um escritor politicamente incorreto e várias vezes acusado de ser racista e anti-semita. Na realidade, ele atacou duramente a ignorância ("Ninguém neste mundo, pelo menos pelo que sei, perdeu dinheiro subestimando a inteligência das grandes massas"), a intolerância ("Um misógino é um homem que odeia as mulheres da mesma maneira que elas odeiam umas às outras"), o cristianismo fundamentalista ("O cristianismo baseado no evangelho, como todos sabem, é fundamentado no ódio, enquanto o cristianismo de Cristo é baseado no amor") e os "Booboisie", sua palavra para denominar a ignorante classe média americana. Sua obra mais conhecida foi The American Language, um estudo em vários volumes sobre as diferenças do inglês nas diversas partes da América do Norte. Talvez suas convicções possam ser entendidas em uma de suas frases mais contundentes: eu acredito, mais do que qualquer coisa, que é melhor falar a verdade do que mentir, que é melhor ser livre do que ser escravo e é melhor saber do que ser ignorante.

Apparício Torelly
Já no Brasil, o gaúcho Apparício Fernando de Brinkerhoff Torelly era o narrador das mazelas do povo brasileiro, mas sempre com muito humor. Radicado no Rio de Janeiro, criou o jornal A Manha em 1926, brincando com outro veículo importante da época, o periódico A Manhã, onde trabalhou. Mesmo sendo um socialista, com sua irreverência incrível se intitulou Duque de Itararé em 1930, um herói da grande batalha que nunca houve, segundo ele. Mas semanas depois Torelly se rebaixou a Barão como prova de modéstia. Incansável perturbador de Getúlio Vargas ("O Estado Novo é o estado em que nos encontramos"), foi seqüestrado e espancado por oficiais da marinha em 1934 e a redação de seu jornal foi completamente destruída. Após reformar o jornal, mandou colocar na porta a tabuleta "Entre sem bater", utilizando sua desgraça como forma de escárnio. A Manha teve várias mortes e renascimentos até 1952, quando desapareceu definitivamente. Torelly foi eleito deputado pelo PCB do Rio de Janeiro com o sensacional slogan "Mais leite, mais água, mas menos água no leite ¿ Vote no Barão de Itararé, Apparício Torelly". Bricar com palavras e misturar crítica social com sabedoria popular foram suas marcas registradas. Entre suas definições mais famosas estão:
- Quem inventou o trabalho não tinha o que fazer
- Quando pobre come frango um dos dois está doente
- Um bom jornalista é um sujeito que esvazia totalmente a cabeça para o dono do jornal encher nababescamente a barriga
- O voto deve ser rigorosamente secreto. Só assim, afinal, o eleitor não terá vergonha de votar no seu candidato
- Mulher moderna calça as botas e bota as calças
- A televisão é a maior maravilha da ciência a serviço da imbecilidade humana
- O casamento é uma tragédia em dois atos: um civil e um religioso
- A alma humana, como os bolsos da batina de padre, tem mistérios insondáveis
- O homem é um animal que pensa; a mulher, um animal que pensa o contrário. O homem é uma máquina que fala; a mulher é uma máquina que dá o que falar
O Barão de Itararé abriu caminho para futuros nomes do humor brasileiro como Stanislaw Ponte Preta, Millor, Jaguar, Luis Fernando Veríssimo e pode ser considerado o avô do pessoal do Casseta & Planeta.

Serviço:
Nas livrarias brasileiras é possível encontrar dois livros de Mencken: O Livro dos Insultos (Companhia das Letras) e O diário de H. L. Mencken (Bertrand Brasil).
Se quiser ler parte da obra de Apparício Torelli, comece por Almanhaque para 1949 (Edusp) e Máximas e Mínimas do Barão de Itararé (Editora Record).

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