quinta-feira, 24 de março de 2011

Jerry Lewis, o palhaço triste

Publicado no site da revista Alfa em Março de 2011
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Jerry Lewis disse certa vez que não existe uma distância entre comédia e tragédia, mas no caso dele, a dor e a tristeza estiveram sempre reservadas para a vida pessoal. Nas telas, Jerry é um verdadeiro fabricante de risadas com seu jeito atrapalhado, bobalhão, misturando a comédia física do palhaço com piadas surreais do mímico. O homem que por décadas cantou, dançou (ou como definiu Sammy Davis Jr, foi o maior fingido branco em questões de dança), escreveu roteiros, estrelou 69 filmes e séries de TV, completa 85 anos de idade hoje.

Lewis ficou muito conhecido nos anos 1950 por sua parceria com o galã ítaloamericano Dean Martin. Os dois começaram com shows em clubes onde Martin cantava e Jerry aparecia como um garçom desastrado que deliberadamente acabava com o espetáculo. O sucesso os levou para as rádios, para a TV e obviamente para o cinema. Acontece que o comediante acabou sendo mais popular que o cantor não só entre os fãs, mas na imprensa. Isso, aliado ao fato da esposa de Lewis ter ficado louca da vida quando Dean Martin trocou a mulher por uma menina bem mais nova, colaboraram para a separação dos dois em 1956. Martin e Lewis apareceram juntos esporadicamente nos anos que se seguiram, mas só fizeram uma performance ao vivo, como dupla novamente em 1976 quando Frank Sinatra os reuniu em um Telethon. A  morte do filho de Martin em 1987 os reaproximou de vez e continuaram amigos até Dino nos deixar em 1995.

Foi na carreira solo que mostrou suas maiores qualidades em filmes como O Mensageiro Trapalhão (onde dá um show de piadas surreais e trabalha sem falar), O Cinderelo Sem Sapato (uma versão masculina do conto de Cinderela), O Terror das Mulheres, Mocinho Encrenqueiro e, um dos seus melhores e mais conhecidos filmes, O Professor Aloprado (a primeira cena onde Buddy Love aparece com a câmera subjetiva é sensacional e fez com que Lewis pudesse brincar com seu ar de galã).
A partir do final da década de 1960, Lewis se dedicou mais à TV e passou a dar aula de direção cinematográfica na Universidade do Sul da Califórnia. George Lucas e Steven Spielberg foram seus alunos. Outro grande projeto que se dedicou integralmente foi a Associação de Distrofia Muscular, criada em 1949. Lewis nunca explicou o porque de sua ligação com a doença (deduz-se que alguém da família ou amigo próximo sofresse da doença), mas a partir de 1966 criou e passou a apresentar o famoso Telethon, a maratona televisiva para arrecadar fundos para pesquisa e auxílio a quem sofre de problemas motores.

Uma queda durante uma piada em um show de 1965 no sands Hotel trouxe gravíssimos problemas em suas costas, quase fazendo com que perdesse os movimentos. Lewis sentia tanta dor que quase tentou o suicídio (seu fuilho entrou no quarto quando ele estava com a arma na mão) e ficou viciado no medicamento Percodan. Lá por 1978 afirmava ter se livrado do vício, e desde 2002, possui um neuroestimulador sinérgico implantado em suas costas que reduz a dor e lhe dá mais liberdade. Outra medicação, Prednisone, que tomava para fibrose pulmonar acabou aumentando consideravelmente seu peso e impedindo-o de trabalhar. Em 2003, tambem se livrou do remédio.  Além disso, os anos de atividade ferrenha lhe deram dois enfartes, diabetes e câncer na próstata.

Mesmo assim, Jerry Lewis nunca deixou de fazer rir e de emocionar. Trabalhou esporadicamente em filmes e seriados com destaque para O Rei da Comédia de Martin Scorcese, Arizona Dream com Johnny Depp, Rir é Viver com Oliver Platt e em seriados como Homem da Máfia, Law & Order e Mad About You. Aos 85 anos, provavelemnte deve lamentar não ter conseguido realizar dois sonhos: filmar o livro ‘Apanhador no Campo de Centeio’, seu preferido  e ter conseguido lançar o filme The Day the Clown Cried que fez em 1972 e que, por problemas jurídicos, nunca viu as telas de cinema. Nele, o comediante faz um palhaço que, preso pela Gestapo, tem que entreter as crianças em um campo de concentração, antes delas serem enviadas para a morte. Uma imagem perfeita para o cara que, não importasse qual fosse a desgraça que ocorria em sua vida e no mundo, estava fazendo todo mundo rir. Parabéns, Jerry Lewis!

Eu sou multi-facetado, talentoso, genial, rico e internacionalmente famoso. Eu tenho um QI de 190 -- que é suposto ser um gênio. As pessoas não gostam disso. A minha resposta a todos os meus críticos é simples: eu gosto de mim. Eu gosto do que me tornei. Estou orgulhoso do que eu tenho conseguido, e eu realmente não acredito que eu tenha arranhado a superfície ainda.

E agora a sensacional cena de Mocinho Encrenqueiro onde Lewis dá um show com seu talento, acompanhado da orquestra de Count Basie, com a música ‘Blues in Hoss Flat’. Você nunca mais vai conseguir participar de uma reunião em sua empresa sem se lembrar dele!

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