Link
Está em cartaz em São Paulo, no Teatro Imprensa, a peça “12 Homens e uma Sentença” sobre um corpo de jurados que tem que decidir a vida de um garoto de 16 anos de idade que teria matado o pai, em um tribunal de Nova York. O lance é que esta obra não é teatral. Na verdade, começou como roteiro de TV, virou filme, foi para os palcos, voltou à TV e agora está sendo representada no Brasil.
Explicando melhor, havia um programa na TV americana chamado Studio One. Era uma série que durou de 1948 a 1958 e trazia a cada episódio alguma obra dramática. Foi aí que um de seus roteiristas, Reginald Rose, foi chamado para ser júri em um caso de assassinato e se viu em uma briga ferrenha de oito horas de duração para decidir o destino do acusado. Lá pelas tantas pensou “que ótimo cenário para um drama televisivo”. E assim surgiu a história do corpo de júri que é fechado em uma sala para montar o veredito em cima de um caso de assassinato. Todos estão convencidos de cara de que o menino acusado é realmente culpado, mas um jurado, o de número oito (não há nomes na trama) discorda do grupo e diz que ele tem dúvidas da culpabilidade do réu. É o bastante para inflamar os egos do grupo e cada um destilar seus conceitos, preconceitos e traumas no decorrer da trama.
A história era boa demais para ficar contida em um espaço de 50 minutos e assim Rose foi convidado a estendê-la para um longa metragem. Henry Fonda foi escolhido como o ator principal e Lee J. Cobb era seu nemesis na sala. Para a direção foi chamado Sidney Lumet, na época diretor de programas de televisão e que nos brindaria anos mais tarde com Serpico, Um Dia de Cão, Rede de Intrigas e Antes que o Diabo Saiba que você está Morto. Fonda também foi produtor do filme, a única vez em sua carreira (ele se arrependeu amargamente da experiência). Os atores ensaiaram exaustivamente por duas semanas e as filmagens duraram apenas 21 dias.
Uma das coisas interessantes do filme é que cada jurado representava um estilo e classe social. O jurado número 1, o fraco líder do grupo, é treinador em um colégio, o jurado 2, tímido e amedrontado que aos poucos acha sua força é caixa de um banco; o jurado 3, essencial na trama, é dono de uma empresa de mensagens; o quatro, frio e lógico é corretor na bolsa de valores; o jurado 5 veio dos guetos; o sexto é pintor de paredes; o sétimo, infantil e fanático por baseball é vendedor de geléia; o jurado 8, o que difere de todos, é arquiteto; o nono é um velho aposentado; o décimo, racista e radical, é dono de um estacionamento; o 11o, imigrante naturalizado, é relojoeiro e o último, fútil e sem opinião, é publicitário.
O filme não foi um sucesso de bilheteria, muito por causa do cinema colorido (ele é P&B), mas a crítica amou. Concorreu a três Oscars e perdeu para A Ponte do Rio Kwai, mas se tornou o favorito da ex-primeira dama, Eleanor Roosevelt e um dos três preferidos de Henry Fonda. Entre os anos de 1960 e 2000, 12 Angry Men teve diversas adaptações teatrais, que não seguiam à risca o conceito original, algumas misturando homens e mulheres e outras somente com mulheres.
Cinquenta anos depois de seu lançamento, uma nova versão em longa foi lançada para a TV com elenco estelar: Jack Lemmon (como jurado 8), George C. Scott (como o 3), James “Tony Soprano” Galndolfini como o pintor de paredes, Armin Mueler Stahl como o corretor, entre outros. Rose foi chamado para atualizar seu roteiro, mas recusou-se a colocar mulheres no juri. Segundo ele, se fosse assim, o nome teria de ser alterado para “12 Pessoas e uma Sentença” e não ficaria tão forte. Ao invés disso, acrescentou mais negros e teve a coragem de colocar o personagem racista como um afrodescendente. O resultado é tão bom como o original.
E por que você deve ver 12 Homens e Uma Sentença?
Não é um filme simplesmente para quem gosta de dramas de tribunais ou feito para quem estuda Direito. 12 Homens é uma obra que nos ensina a analisar uma situação, colocando de fora nossas emoções e pré-conceitos. Mostra como um grupo de pessoas heterogêneas pode, por enxergar algo dentro de uma ótica distorcida por dogmas, tomar decisões errôneas e cheias de ódio e raivas subliminares. É um filme que mostra qual é o problema de um grupo com liderança pífia, o que pode acontecer quando um elemento assume uma agressividade descontrolada e como certas pessoas não conseguem focar em uma situação, usando recursos como piadas e postura desinteressada, timidez e gritos justamente para não ter que assumir nenhum risco. Ele já foi usado muitas vezes em treinamentos e palestras justamente como exemplo de dinâmica grupal e para técnicas de resolução de conflitos e seguramente você vai se identificar com mais de um personagem.
Se você estiver em São Paulo, vale a pena ver a peça (as interpretações estão ótimas, e garante muitos risos nervosos) e depois ver o filme (ou vice-versa). Se não estiver, adquira o filme. Dificilmente você chegará ao final dele com as mesmas idéias que tinha quando colocou o disco no aparelho.
Nenhum comentário:
Postar um comentário