sexta-feira, 16 de setembro de 2011

O grande filme de ação de Hitchcock

Publicado no site da revista Alfa em agosto de 2011
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Cheguei à conclusão que Intriga Internacional de 1959 é um filme que se comporta como um bom vinho. Quanto mais tempo passa, melhor fica. E não é para menos! Possui uma série de ingredientes campeões para dar certo. A começar pela direção segura do próprio Hitch à vontade em um de seus temas recorrentes, o do homem errado. Depois vem o roteiro fantástico de Ernest Lehman, que escrevera Sabrina, o cáustico A Embriaguez do Sucesso e depois nos daria Trama Macabra. Some a isso a fantástica música de Bernard Herrmann e a abertura de Saul Bass e já se tem um filmão.

 A idéia do filme começou quando Hitchcock comentou com Lehmann em um almoço que queria poder fazer um filme com uma perseguição nos rostos dos presidentes do Monte Rushmore. Disse ainda que queria uma cena que fosse passada no prédio da ONU, onde uma sessão não poderia começar enquanto não acordassem o representante do Peru (palavras dele, não minhas). Assim, o roteirista desenvolveu a história de um publicitário de sucesso, Roger Thornhill, que é confundido com um espião, George Kaplan, e precisa escapar de vilões e ainda tentar achar o verdadeiro Kaplan. O problema é que o agente não existe. É apenas um personagem inventado pela inteligência para distrair seus inimigos. Ainda no caminho surge uma bela loura sedutora para complicar ainda mais (ou não) a vida de Thornhill.

Hitchcock acreditava que vilões deveriam ser muito bem construídos ou o filme naufragava, então o sempre classudo James Mason foi escalado para ser o homem que transforma a vida do publicitário em um inferno e um “mefistofélico” Martin Balsam era seu braço direito (é engraçado como este só ficou “simpático” depois de velho). James Stewart, veterano dos filmes de Hitch, queria desesperadamente o papel de Thornhill, mas o diretor o achava “muito velho” para o personagem. Os estúdios tentaram empurrar Gregory Peck, mas Cary Grant acabou sendo escolhido, mesmo sendo quatro anos mais velho que Stewart.  Hitchcock tinha uma paixão platônica por louras sensuais como Grace Kelly até mesmo para suplantar o fato de ser feio, velho e muito gordo. Em Intriga Internacional a bola da vez foi Eva Marie Saint, que aparecera em Sindicato de Ladrões.

Aliás as cenas entre Eva e Grant são daquelas de fazer você pensar em porque nunca uma  mulher desconhecida falou com você daquele jeito. Existe uma química toda especial entre os dois e o processo de sedução é verdadeiramente invejável, com diálogos precisos e troca de olhares esclarecedoras (se você assistiu também Os Agentes do Destino e prestou atenção em Matt Damon e Emily Blunt sabe do que estou falando).

Outra coisa que se destaca neste clássico são as cenas de ação. A mais famosa acabou sendo a de Grant sendo perseguido por um avião em meio a um campo aberto. O extraordinário da sequencia é justamente os momentos de silêncio que antecedem a tensão, com Grant de um lado da estrada e um caipira do outro até que este último comenta que o avião estava pulverizando uma área que não possuía plantações. É o bastante para sabermos que algo de ruim vem por aí. Quando entrevistado por Truffaut, Hitch disse que quis zombar com o clichê do “personagem que vai em direção à própria morte”, criando todo um clima só para Grant poder escapar. E, obviamente, temos a sequencia final no Monte Rushmore. Aliás, antes dela, temos um dos mais famosos furos do cinema, quando na cena do tiro no restaurante do parque, se você prestar atenção em um menino no lado direito da tela, verá que ele leva os dedos ao ouvido bem antes do tiro ser disparado. E, em tempo, apesar do filme ter uma sequencia na ONU (filmada sem permissão), não há nenhuma menção do delegado do Peru.
Hitchcock tinha um contrato com a MGM onde o estúdio não podia interferir com o filme e assim conseguiu fazer um dos melhores filmes de mistério e espionagem já produzidos. Acabou sendo escolhido o 55o melhor filme do século pelo American Film Institute e o grande encerramento da fase de ouro de Alfred Hitchcock, já que no ano seguinte ele partiria para uma experiência mais aterradora com Psicose.

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