segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Dois homens, uma mulher e o Texas

Publicado no site da revista Alfa em novembro de 2010
Link

Se estivesse vivo, Roy Harold Scherer Jr. ou Rock Hudson como ficou conhecido, teria completado ontem 85 anos. Alto, bonito, simpático e charmoso, foi um dos maiores galãs e símbolo de masculinidade que já apareceu nas telas, apesar de sua vida secreta. Ele ficou muito popular nos anos de 1960 com suas comédias deliciosas e açucaradas ao lado de Doris Day e Tony Randall como Confidências à Meia-Noite ou Não me Mandem Flores e depois como Stewart McMillan na ótima telessérie policial Casal McMillan, que durou de 1971 a 1977. Só que não houve nenhum papel que tivesse o impacto e a força de seu Jordan “Bick” Benedict Jr. de Assim Caminha a Humanidade lançado em 1956.

Baseado na obra de Edna Ferber (que escrevera outra obra que se tornou sucesso nos cinemas, Cimarron) e dirigido por George Stevens (ele ganhou um Oscar por ele e também ficou conhecido por ter filmado a liberação -- real -- dos campos de concentração nazista), o filme ficou marcado por ter sido o último trabalho do ícone da rebeldia James Dean. Se você nunca assistiu, Giant - o nome original e não o exagero brasileiro -- narra a história da transformação do Texas, de suas enormes fazendas de gado nos anos 1920 para o pólo petrolífero dos Estados Unidos na década de 1950, focando em uma família, os Benedict. Mostra desde o casamento do fazendeiro texano Jordan com a nortista Leslie (Elisabeth Taylor, deslumbrante) até os primeiros anos de seus netos. No meio disso tudo, existe o empregado da fazenda, Jett Rink (James Dean), que vai dar muita dor de cabeça ao seu patrão. Enquanto nos faroestes ser homem era sobrepujar o outro atirando mais rápido, aqui a luta entre os dois rivais se dá através de poder e do dinheiro. Principalmente quando o que está em jogo é a atenção de Elisabeth Taylor

Em três horas e vinte de narrativa (que você não sente, porque é uma aula de cinema), vemos passar tipos maravilhosos e envolventes como Luz, a durona irmã de Jordan, interpretada por Mercedes MacCambridge; a filha rebelde do casal principal, Luz Benedict II (a maravilhosa Carroll Baker que era mais velha que Taylor); o filho que causa um desgosto danado ao pai Jordan ao se casar com uma mexicana (Dennis Hopper, 13 anos antes da psicodelia de Sem Destino) e o melhor de todos, o Tio Bawley (Chill Wills) que serve de consciência para todos os personagens e que tem as melhores sacadas do filme (por exemplo, quando Dean acha petróleo em seu pedaço de terra e esfrega isso na cara de Rock Hudson, o velho só faz um comentário: “Você devia ter atirado nele anos atrás. Agora ele é muito rico para ser morto”).

James Dean, aliás, especializara-se em personagens tão tristes e problemáticos como ele mesmo. Fez um filho rebelde em Juventude Transviada, outro filho com graves problemas paternos em Vidas Amargas e agora seu Jett Rink, baseado no magnata do óleo Glenn McCarthy, não foge à regra, com terríveis questões de autoridade, desafiando o patrão e, depois de rico, tornando-se seu maior concorrente. Dean era um ator do “método” de Lee Strassberg e do Actors Studio e apesar de discutir à beça com o ditatorial Stevens, imprime em Rink uma profundidade e força que são difíceis de se encontrar até hoje. Um dos destaques na formação do personagem é sua maneira de encerrar uma frase, movendo a mão de um lado para outro e olhando para o lado, que além de marcante, faz com que você saiba que, com isso, ele estava mandando seu interlocutor para um pouco mais longe que o Rio Grande. Já Hudson consegue fazer um Bick bronco, durão e ao mesmo tempo sensível e paternal, que vai descobrir que seu estilo de vida e de pensamento estão caindo em desuso à medida que a história se passa. Sua conclusão no final que seu neto mestiço (meio chicano, meio americano) parece ser mais esperto que o neto 100% americano é um divertido sinal dessa evolução.

Brilhantemente fotografado, Giant discute racismo, concorrência, política, amadurecimento, riqueza, rebeldia e transformação. O filme consolidou a carreira de Hudson e Taylor e transformou Dean (que morreu em um acidente de carro no fim das filmagens) em uma lenda. Mesmo se o estúdio tivesse dado seguimento à idéia original de colocar Grace Kelly, John Wayne e Alan Ladd nos papéis principais, ainda assim seria um filme fascinante. Apesar do custo de cinco milhões (contra dois do orçamento inicial) e de ter ficado um ano sendo editado, foi a maior bilheteria da Warner Brothers por décadas, sendo que essa marca só foi superada em 1978 com o lançamento de Superman -- O Filme. É um dos meus filmes favoritos e recomendo a qualquer um que queira ver como um homem de verdade pode ser.

Nenhum comentário: