terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Livro relata a aventura de dois brasileiros velejando de Miami a Ilhabela

Publicado no Terra em dezembor de 2009
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Era 24 de fevereiro de 1994 quando dois brasileiros deixaram Miami a bordo para enfrentar 13.500 kilômetros de mar em 289 dias de aventura com destino a Ilhabela, mas com um detalhe muito original, entrariam no Brasil pela Amazônia. Para adicionar mais um detalhe insólito nessa história, os dois viajaram em dois Hobby Cats 21 Sport Cruiser, um catamarã sem cabine nem motor, não muito ideal para uma travessia oceânica. A saga toda está contada no recém-lançado livro Entretrópicos da Editora Terra Virgem.

» Veja a capa do livro

Os dois aventureiros eram Beto Pandini, empresário da noite paulistana e Marcus Sulzbacher, publicitário, mas no caminho 19 outras pessoas subiram a bordo dos dois barcos, como o fotógrafo Gui von Schmidt e o sul-africano Duncan Ross, este sim o mais gabaritado em conhecimentos náuticos. O livro, com fotos deslumbrantes, é dividido em três partes: As Ilhas, com o trajeto pelas Bahamas, República Dominicana, Porto Rico e Pequenas Antilhas; Os Rios, quando entraram no continente sulamericano pelo rio Orinoco na Venezuela (desta vez com motor de popa para navegar contra a corrente) e depois seguiram pelos rios Negro e Amazonas até chegar em Belém e finalmente A Costa com a descida pelas praias brasileira (mais uma vez contra a corrente) até Ilhabela em São Paulo, onde chegaram em 6 de novembro.

Os relatos são muito divertidos e interessantes como a hospedagem gratuita em um resort nas Antilhas, as dificuldades de se lidar com a polícia venezuelana e até mesmo uma excursão ao Pico da Neblina, onde jogaram fora uma placa deixada lá pelo ex-presidente Fernando Collor. Também é emocionante os relatos sobre as pessoas que encontraram no caminho, todos muito solidários e encantados com a disposição dos marujos em vencer as águas e cumprir o seu objetivo.

Para saber mais da incrível aventura, fomos conversar com Beto Pandiani e tentar entender o que move um grupo de pessoas a passar quase um ano em perigo constante.

Terra: Quinze anos se passaram entre a aventura Entretrópicos e a publicação do livro. Por que tanto tempo para contar como foi?
Beto Pandiani: Parece mesmo uma ironia, a primeira viagem foi a mais simples de ser viabilizada financeiramente, mas a mais difícil de ser documentada em livro. Quando terminamos a viagem no final de 1994 oferecemos aos patrocinadores a oportunidade de publicarmos um livro fotográfico e eles aceitaram. Começamos mas logo no inicio de 1995 uma crise econômica desastrosa varreu nosso projeto do mapa, tudo foi cancelado. Acabei voltando para minha atividade com restaurantes porque não pude dar continuidade aos meus projetos. Foi frustrante e depois quanto mais tempo foi se passando mais difícil foi ficando. Há três anos decidi pedir a Editora Terra Virgem para incentivar o projeto do livro Entretrópicos porque ia tentar viabilizá-lo. Foi o que aconteceu. Se eu acreditasse que as coisas são casuais diria que foi um "acidente" vender o livro depois de tantos anos.

Terra: Pela narrativa, a impressão que temos é que houve um planejamento, mas não a exata noção de todos os perigos que a viagem continha. Até que ponto foi um risco calculado?
BP: Sabemos que quando uma viagem começa a chance de terminarmos não é grande, não por falta de planejamento ou por falta de capacidade, mas entendemos que andamos contra todas as estatísticas. Nunca sabemos se vamos conseguir terminar, mas nunca duvidamos do que podemos. O primeiro objetivo é voltar para casa, o segundo é chegar onde queremos mais amigos do que quando partimos. Pode-se pensar em muitos riscos e se preparar, mas a vida no mar trás um componente muito forte, o imponderável. A natureza é imponderável e o máximo que podemos fazer é nos prepararmos para o pior.

Terra: Houve algum momento em que vocês pensaram em desistir ou que a "canoa quase virou"? De tudo, qual foi o pior trecho?
BP: Nunca passou pela minha cabeça desistir. Já aconteceu o contrário, tentar imaginar um jeito de prolongar a viagem. Piores trechos foram vários, mas os mais críticos de todas as viagens, foram a travessia da Passagem de Drake, ao sul da Patagônia chilena e argentina e agora a travessia do Pacífico quando as quebras nos deixaram extremamente vulneráveis. Pela primeira vez quase fomos obrigados a pedir um resgate. Não aconteceu por pouco. Quanto a risco de vida eu nunca me senti próximo a uma situação limite.

Terra: Existe a passagem onde vocês escalam o Pico da Neblina e jogam fora a placa deixada por Collor. Você não teme uma reação do ex-presidente?
BP: Jogamos a placa fora e na época noticiamos para a mídia. Jogaria de novo. Vejo que os valores morais estão atrasados, na época da Idade Média. A tecnologia avançou e nós ficamos no passado. Esta noção de modernidade é ilusória e nos coloca em um estado de sonambulismo. Seria bem sadio se todos se manifestassem, pois o Collor foi eleito para um cargo público, não para ser dono de um feudo. Não tenho medo algum. Se cada um tivesse noção da sua força e importância nós seríamos mais unidos e tenho certeza que não teríamos governos impunes que nos fazem de bobos.

Terra: O fator humano é muito forte na narrativa, especialmente a descoberta que as pessoas podem ser muito solidárias. Depois da aventura, vocês mantiveram esse espírito? E como isso alterou a vida de vocês depois da chegada?
BP: Este é o meu olhar, como fui eu que escrevi o livro só posso responder por mim. Acho que foi o contrário, este espírito de olhar as pessoas com compaixão eu levei comigo. O que eu trouxe de volta é a certeza que o homem vale a pena. O que alterou na minha vida é que hoje posso falar do que vi e vivi. São testemunhos reais e longe da pretensão de explicar o mundo, posso dizer que aprendi muito sobre a nossa natureza e quero dizer a natureza humana.

Terra: Por falar em depois, o que aconteceu com cada um dos tripulantes nesses 15 anos?
BP: Em cada viagem fui montando equipes que algumas vezes se repetiram e em outras oportunidades foram renovadas. Tenho meus companheiros como algo sagrado, pois foram pessoas que compartilharam momentos únicos e muito especiais para mim. Hoje todos estão em outras atividades profissionais. Sou o único que vive exclusivamente das viagens e continuamos todos conectados.

Terra: Que outras aventuras você fez?
BP: Desde que me conheço por gente, gosto de viajar. Fiz outras viagens que não foram patrocinadas, mas me trazem boas recordações. Viajei 50 dias de moto pela Patagônia em 1989, indo até Ushuaia, participei da Regata dos 500 anos Portugal - Brasil, duas longas viagens no final dos anos 70 acampando pelo litoral do norte do Brasil até São Paulo. Foram muitas outras, mas sempre em caráter pessoal.

Serviço

Entretrópicos - De Miami a Ilhabela a bordo de dois Hobie Cats 21
Terra Virgem Editora
Textos de Beto Pandiani e Xavier Bartaburu
Fotos de André Andrade, Gui von Schmidt e Roberto Linsker
120 páginas - Preço: R$ 70,00

Um comentário:

Marcelo Tadeu disse...

Realmente uma grande aventura, e o livro deve ser bem interessante!!
... Você chegou a conversar com o Spina sobre a viagem dele e do Cacá do Alaska a Patagônia de carro? Essa é outra das boas (inclusive eles estão no Guiness por isso - 23,5 mil Km em 18 dias)!
Dá uma olhada no link:
http://ecoviagem.uol.com.br/blogs/desafio-panamericano/boletins/