domingo, 1 de novembro de 2009

Livro, HQ e tese científica abordam os vários aspectos de Deus

Publicado no Terra em outubro de 2009
Link

Para alguns Ele é a fonte de toda a vida, um ser onipresente, onisciente e onipotente, que representa a bondade absoluta e a eternidade. Para outros, Ele está dentro de cada um dos seres vivos e em toda a natureza. Já existem aqueles que crêem numa entidade incorpórea e sem forma e ainda tem o grupo de pessoas que não acredita que Ele exista. Deus e sua existência ainda é um assunto polêmico, fascinante e divisor de opiniões entre o ser humano, seja ele, um crente ou não.

Para jogar um pouco de lenha na fogueira sobre o papel de Deus na criação do universo, a professora holandesa Ellen van Wolde, uma das grandes especialistas no estudo e interpretação do Velho Testamento, anunciou no começo do mês de outubro que o início do Gênesis da Bíblia tenha sofrido uma corruptela de tradução há milhares de anos. Segundo ela, ao analisar milenares versões do livro sagrado e compará-los com lendas da antiga Mesopotâmia, verificou-se que a palavra hebraica "bara", que havia sido traduzida como "criação", na verdade significa "separação" e portanto, Deus não criou o planeta e sim separou o céu da terra, desenvolvendo toda a vida nele. A professora Van Helde, que já trabalhou inclusive com o premiado escritor Umberto Eco, afirmou que o início da Bíblia não seria o começo do universo e sim o princípio de uma narrativa. E complementa: "pelos relatos, a Terra já possuía monstros marinhos e portanto já tinha água. Deus criou algumas coisas, mas separou mares dos céus". Obviamente que uma teoria destas vai criar celeuma no mundo religioso, mas a especialista, que se considera uma crente na existência do Divino, afirmou que se Deus é verdade, então ela está simplesmente reforçando essa idéia.

Errado ou não, o Gênesis ganhou uma interessantíssima versão nas mãos de um dos pais dos quadrinhos underground dos anos 60 e criador do fantástico Fritz, The Cat, o controverso Robert Crumb. Acontece que se alguém for procurar algo subversivo, anárquico ou profano nas páginas da HQ, vai se decepcionar. Na introdução do livro, Crumb explica que simplesmente reproduziu cada palavra do texto original, não tentando modernizá-lo em nenhum momento. E vai além: "não acredito que a Bíblia é a "palavra de Deus" ou "inspirada por Deus". Acredito que é a palavra dos homens. É, no entanto, um texto poderoso, com camadas de significados que mergulham fundo em nossa consciência coletiva. Parece mesmo ser uma obra inspirada". O trabalho, que levou quatro anos de estudos, foi lançado na semana passada no Brasil pela Editora Conrad. Embora na Inglaterra e nos Estados Unidos tenha gerado um debate sobre a inclusão de cenas de sexo e nudez na história, algumas autoridades eclesiásticas defenderam o trabalho, mesmo porque o Velho Testamento tem passagens envolvendo justamente sexo e nudez.

Para aqueles que querem se aprofundar ainda mais no tema, a Editora Planeta traz para o Brasil um dos momentos mais incríveis e maduros da discussão religiosa, o livro "Deus Existe?". Em 21 de fevereiro do ano 2000, o então cardeal Joseph Ratzinger, hoje Papa Bento XVI, concordou em participar de um debate com o jornalista e filósofo ateu italiano, Paolo Flores d´Arcais sobre questões de fé e dogmas da igreja católica sendo mediados pelo escritor e jornalista judeu Gard Lerner. Um dos pontos altos da conversa é justamente tentar responder se alguém pode viver sem fé. Obviamente que Paolo Flores acredita que em termos de fé religiosa isso é possível já que por mais que crer em Deus e nos dogmas pode trazer conforto e ilusão, também pode nublar a mente para novas idéias. O cardeal Ratzinger já leva o assunto para o aspecto do crente valorizar o amor e não o ódio, a verdade contra a mentira e que tudo isso vem e depende de Deus. Acontece que ambos concordam com o fato de que não é preciso ser um fiel para manter valores elevados em termos éticos e morais. Com profundo respeito pela crença alheia, Flores e o cardeal Ratzinger falam ainda sobre as origens do Deus único, os abusos da Igreja Católica no passado e sua antipatia pelas questões iluministas e analisam o papado de João Paulo II. O livro traz ainda o texto "A pretensão da verdade posta em dúvida" de autoria do atual papa sobre os desafios da Igreja Católica no século XXI e "Ateísmo e verdade" de D´Arcais, inicialmente publicados na revista italiana Micromega.

Voltaire disse que se Deus não existisse, teríamos que inventá-lo. Já Mark Twain declarou que Deus é o mais popular bode-expiatório do mundo pelos nossos pecados. Existe porém uma frase do escritor e ensaísta Joseph Joubert (1754 - 1824) que serve perfeitamente para explicar o porque esse vasto assunto nunca terá uma conclusão: "é mais fácil entender Deus enquanto você não tentar explicá-lo".


Serviço

Deus existe?
Editora Planeta - 128 páginas - R$ 19,90

Gênesis por Robert Crumb
Editora Conrad - 224 páginas - R$ 49,90

3 comentários:

Marcelo Tadeu disse...

Cláudio, parabéns!! O texto está excelente, cutucando a todos sem agredir.
Mas como você bem disse, é um "assunto polêmico, fascinante e divisor de opiniões entre o ser humano, seja ele, um crente ou não"... Portanto, esperemos as discussões.
Em tempo: a frase/pensamento de Joseph Joubert diz tudo!

Claudio R S Pucci disse...

Tadeu,

Obrigado. O objetivo não foi nem cutucar alguém, porque Deus é algo muito pessoal e muito especial para cada pessoa, até mesmo para aqueles que não acreditam. De qualquer maneira, merece a reflexão e até mesmo a discussão saudável (por isso me impressionei com o livro "Deus Existe?").

Marcelo Tadeu disse...

Está incluso na minha lista!
Abraço